Artigo publicado como resposta à nobre referência feita pelo colega Marcos Dantas, de um texto igualmente nobre de Antonio Gramsci.
Não aprecio os perversamente indiferentes tanto quanto os necessariamente - ou até patológicamente - diferentes. Assim como descrevem as antigas letras de Confúcio, acredito que viver é reconhecer a existência alheia de todos os modos assim como a nossa: conhecendo as iniciativas políticas e vontades do indivíduo em suas ações, sabemos conceituar - de acordo com nosso formão moral - aqueles que consideramos indiferentes ou diferentes às nossas idéias e posições. Seria minimalista pensar que todos os que se engajam na luta partidária, necessariamente são militantes justos e pró-ativos: assim como seria pragmaticamente simplificador acreditar que todos aqueles que não pretendem traçar linhas definidoras de sua personalidade política sejam indiferentes à realidade que os cerca. Gramsci ensina que "(...) Quem verdadeiramente vive não pode deixar de ser cidadão, e partidário... ". e sem dúvida havemos de concordar, pois cada argumento e cada idéia tem em si seu quinhão de posicionamento político, ainda que subliminarmente incluído no discurso. O grande problema, é a diferença necessária, que podemos entender como doentia: do discordar pelo discordar, ação vazia, improdutiva ao debate, realizada muitas vezes através da soberba e da cultura política autoritária. A diferença que se observa é o contraste do nutrir um debate não pela idéia norteadora de contrução conjunta de idéias, mas alicerçado no maniqueísmo do BEM e do MAL da política, do argumento CERTO e do argumento ERRADO. As discordâncias são importantes, mas os pontos em comum tem sua sublime e relativa relevância aos processos democráticos de encaminhamento de diversos temas.
"A indiferença é o peso morto da história..." sim, mestre Gramsci, mas a intolerância - fruto da diferença que atento - é o fundamentalismo que ainda hoje, após diversas novas perspectivas de direito, ainda reproduz problemas à sociedade. A intolerância, dentre outros, é também a diferença fundamentalizadora e vazia. São ambas como as ferramentas que entalham muros em quintais vizinhos, são como armas letais em guerras fratricidas. São o castelo onde se encontram os escolhidos da dialética, os detentores da "verdade" e do argumento melhor burilado, são o feudo onde se degladiam sem cessar os arautos das verdades próprias, egóicas e preconceituosas. Senhores de um só livro, o de seu própria alma. A diferença perversa e seu contraponto sofisticado, o argumento foice, é como o pé sobre a barata, e desencoraja da mesma forma que sua irmã, a indiferença pura.
"A indiferença atua poderosamente na história..." sim, mestre Gramsci, mas a atuação excessivamente fundamentalizante, também confunde os programas, destrói os planos mesmo os mais bem construídos, como o senhor mesmo atenta. Os grupos e seus interesses próprios, e em alguns casos estreitos, jogam com a opinião para justificar sua ideologia. Fazem, muitos, do debate propaganda ridicularizante. Enquanto os indiferentes se omitem, aqueles que são diferentes de forma produtiva à construção política democrática também se desmotivam quando são atentados pelos necessariamente diferentes, vazios em sua concepção de unidade e potencialidade de junção de idéias que podem ser, contrastente em suas concepções e objetivos, mas muitas vezes objetivamente próximas e suplementares, independente de seus mentores.
DIz o senhor "A maior parte deles [indiferentes], porém, perante fatos consumados prefere falar de insucessos ideais, de programas definitivamente desmoronados e de outras brincadeiras semelhantes..." mas não existem homens e mulheres "diferentes", "partidários" que também não o fazem quando interpelam seus rivais políticos?. Concordo contigo, quando define que os indiferentes são uma massa inerte e improfícua para o debate e para a materializaçao das demandas e necessidades sociais, mas lembro que a abstenção é uma escolha. REITERO: Não sou partidário da abstenção, ou da omissão, mas sim da idéia integralizadora: da união utópica de conceitos, da fusão impossível de contrastes e de idéias, do reconhecimento puro do todo dado seus contrastes embelezadores e perfeitos para entendermos o que se conhece como sociedade. Eu sonho e gostaria que o gestor tivesse a impossível habilidade de um Maestro político: com a batuta do entendimento, coordenasse os diferentes sons de diferentes instrumentos em nome do encontro musical da Bachiana, da Cânone, das músicas com sua enorme diferença de vozes mas com sutil beleza e enorme inspiração.
Não aprecio os fundamentalizadores de idéias, os "necessariamente" diferentes, também porque me provocam medo seu ódio intolerante, pessoalizado e vazio. Me entediam com seu samba de uma nota só. Peço contas a todos eles pela maneira como oprimiram com suas verdades pessoais, palacianas, interesseiras e muitas vezes provincianas. Sou um militante da compreensão do todo, estou incompleto e por isso o busco, "sinto nas consciências viris dos que estão comigo pulsar a atividade da cidade futura que estamos a construir...": por isso lhes reconheço como meus potenciais aliados na construção desta torre a que chamamos futuro. Pena que pra muitos é de Babel.
"Nessa cidade, a cadeia social não pesará sobre um número reduzido, qualquer coisa que aconteça nela não será devido ao acaso, à fatalidade, mas sim à inteligência dos cidadãos. Ninguém estará à janela a olhar enquanto um pequeno grupo se sacrifica, se imola no sacrifício..." pois todos terão em si o reconhecimento da existência e da necessidade de trocarem idéias diferentes, mas não diferentemente opressoras.
Vivo, sou um militante da compreensão do todo. Sou - talvez - uma negação de mim e a aceitação do outro. Sou o inominável, sou o incompleto, sou a incompletude. Por saber que o que "sou" não é mais que o "ser" alheio, não aprecio quem não toma partido, como também não aprecio os os que só tomam o partido de sua própria verdade.